domingo, 2 de dezembro de 2012

A Revolução do Golfe.


Antes de começarmos a contar este conto, é preciso avisar uma coisa muito importante, que pode (e deve) mudar a sua leitura: isto não é um texto, é um sonho. E como tal, não é compreensível para quem perdeu o dom que é sonhar. Mais um detalhe: mesmo que você acorde, ele já foi escrito. Não esse. Todos eles.


           
            Ele tinha o dom de trazer pra perto, de aglutinar, de se fazer ouvir. Não pela simpatia. Estava até bem longe de ser simpático. Acontece que ele não era ele mesmo há tempos, porque teve que abrir espaço pra mim. Quem sou eu? Sou a mulher do biquíni vermelho. Não. Eu não era necessária. Ele escolheu. Mas devo admitir que não foi na primeira oportunidade. Eu insisti. Pra mim, era necessário.
            No começo, ele achava que eu não existia, até o dia que só eu, apenas eu, sonhava com ele. Mas tem uma explicação: ele tinha me feito e eu, só podia concordar.
            Conversávamos sobre tudo. Tudo. Menos sobre o fato de eu não existir e ele precisar de mim. Discutimos política e falamos de como as pessoas se apegam ao poder e de como elas se convencem de serem essenciais. Ele pensava que não podia ser assim, que tudo acaba, que tudo finda, que tudo ariana, explode. Eu concordava.
            Ele achava que tinha que começar tudo de novo, da estaca 2. Da zero não, porque da zero, não tinha nada e construir tudo do chão dá tanto trabalho. Ele achava que a idéia lançada antes dele, podia ser adequada, melhorada. Eu concordava.
            Então um dia, ele teve uma idéia: nada ia mudar. Bem, qual a idéia, então? Nos olhos negros que eu via (nem sei se eram negros, mas ele me imaginava de olhos fechados e eu nunca os via), ele não podia mudar. Dentro do que já era, dentro do que já foi e dentro do desejo de que fosse, ele manteve. Foi jogar golfe.
            Vestido de branco, fumando charuto e tomando espumante, ele achava que as pessoas iriam ouvi-lo como eu. Que o governo seria discutido baseado na oscilação da bolsa de valores. Que a educação do país seria discutida, enquanto os filhos e filhas de banqueiros passeavam pelo gramado perfeito. Que melhores condições de moradia fossem entrar em pauta na hora que algum dono de multinacional mencionasse a palavra crescimento. Que campanhas de conscientização quanto ao abandono de menores, estariam sendo organizadas, enquanto as senhoras da alta sociedade exibiam seus incríveis anéis.            
            Lembro-me que no dia do início do campeonato, ele me imaginou confraternizando com as senhoras: grande chapéu sobre um ‘coque’, vestido na altura do joelho, de bolinhas pretas e segurando uma taça fina. Jamais aconteceria.
            O sub consciente dele é tão puro, que me deixou crescer e ser, independente dele, um ser. Mas ele não me ouvia, porque ao mesmo tempo em que me criara, estava cansado demais pra achar que construiria algo bom. Eu discordava.
            Última tacada, nenhuma construção, nenhum sonho coletivo que não fossem mesas de aposta, nenhum abraço verdadeiro, nenhuma gargalhada inteira, nenhuma lágrima de criança machucada, nenhum amor, ele olhou para o lado. O mais engraçado, é que ele não viu o que planejou. Viu o que queria que estivesse lá. Sem chapéu, sem bolinhas. Estava eu, nos trajes com que nasci nos sonhos dele, tomando cerveja, fumando filtro branco e falando alto. Muito alto. Nenhuma palavra era direcionada a ele. Eu já nem lembrava que era uma criação. Entretanto, era dele e ele fez uso.
            Bolinha prestes a entrar, o homem balança o taco de um lado para o outro. Ele chuta a ‘porra da bola’ pra longe, apaga o charuto na taça do senhor que acaba de perder o campeonato e sai correndo. Gritando como um louco e achando que era enorme. Era.
            Possuía em si o desejo de mudar não apenas a si. Sabia-se enfim, um sonhador e quando acordou, estava tudo no mesmo lugar. Menos ele.
            E eu, freqüento outros sonhos. Alguns me querem casta. Outros, não me querem. E ainda assim, entro e saio de suas vidas, me despedindo ás vezes, outras não. Sofrendo ás vezes, outras não. Sendo real ás vezes, outras não.

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